
A ameaça do capim-capeta (Sporobolus spp.) para a pecuária brasileira
Moacyr Bernardino Dias-Filho
Eng. Agrônomo, M.Sc, Ph.D., pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental
O Sporobolus spp. (capim-capeta, capim-pt, barba-de-paca, capim-luca, bufa-de-mineiro, capim-barbante etc.) faz parte do grupo de espécies e variedades de capins do gênero Sporobolus cuja invasão pode diminuir a produção de carne e leite e depreciar o valor da propriedade rural, por inviabilizar o uso das pastagens
Nos últimos anos, esse capim vem invadindo pastagens, principalmente nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste do Brasil, sendo, portanto, uma série ameaça para a pecuária brasileira.
A invasão do capim-capeta acelera a queda de produtividade daquelas pastagens que já estão perdendo o vigor e que, portanto, facilitaram o estabelecimento e a proliferação desse capim invasor, em decorrência do processo de degradação da pastagem.
Deste modo, é possível considerar a ocorrência do capim-capeta nas pastagens como um indicador de degradação. Portanto, de acordo com a proporção de ocorrência do capim-capeta em uma pastagem, é possível deduzir sobre a classe de produtividade dessa pastagem (Figura 1).

Figura 1. Relação entre a presença do capim-capeta (Sporobolus spp.) e as classes de produtividade da pastagem.
Potencial invasivo
O potencial invasivo da capim-capeta, ou seja, a sua grande agressividade para invadir e alastrar-se nas pastagens, está centrado em três características principais: a baixa aceitabilidade e valor nutritivo, a alta produção de sementes e poder de dispersão dessas sementes e a alta rusticidade e competitividade da planta.
Assim, embora seja um capim, não tem valor como planta forrageira, pois tem baixo teor de proteína e baixa digestibilidade, sendo normalmente consumido apenas na fase vegetativa, ou seja, antes de produzir sementes (pendoar).
Quando consumido pelo gado na fase reprodutiva (pendoado), por ser muito fibroso, pode causar problemas aos dentes do gado (desgaste prematuro, amolecimento e queda) e formar fitobezoar no sistema gastrointestinal.
As plantas do capim-capeta produzem sementes praticamente o ano todo, sendo que uma única planta desse capim pode produzir cerca de 200 mil sementes por ano. Essas sementes são muito pequenas (1000 sementes pesam em torno de 0,2g) (Figura 2) e podem continuar vivas no solo, por cerca de 10 anos.

Figura 2. Aspecto das sementes do capim-capeta (Sporobolus spp.). Foto: Moacyr B. Dias-Filho
Sob condições de alta umidade, as sementes do capim-capeta produzem uma mucilagem em seu entorno. Essa mucilagem tem a capacidade de absorver água e tornar as sementes pegajosas.
Essa mucilagem pegajosa, que cobre as sementes, facilita a dispersão, pois as sementes podem aderir a máquinas e implementos agrícolas (roçadeiras, grades, arados etc.), veículos, calçados, roupas animais etc. sedo ainda facilmente transportadas na água da chuva, que corre na superfície do solo da pastagem (enxurrada).
Por criar uma camada de proteção, essa mucilagem também contribui para que as sementes germinem, quando estão na superfície de solo.
As plantas do capim-capeta podem se desenvolver em condições adversas (solos compactados, de baixa fertilidade etc.), tolerando secas prolongadas, fogo, roçagens e pastejo pesado.
Dessa forma o capim-capeta se beneficia de práticas de manejo que diminuem o vigor da pastagem, como o superpastejo, o uso frequente de fogo, a ausência de adubação etc., se estabelecendo e proliferando em pastagens que estão tendo queda de produtividade, ou seja, que estão degradando.
Por causa de suas características invasivas e da sua agressividade, o capim-capeta está se tornando, também, uma planta invasora de áreas urbanas, já sendo possível encontrá-lo em algumas cidades, em várias regiões do Brasil (Figura 3).

Figura 3. Aspecto da invasão do capim-capeta (Sporobolus spp.) no canteiro central de uma avenida, em uma cidade do Brasil. (Foto: Moacyr B. Dias-Filho)
Prevenção
O produtor deve considerar a infestação do capim-capeta, em uma pastagem, como uma “pandemia”, que pode “matar” a sua propriedade rural. Portanto, todo e qualquer esforço de prevenção ou de controle dessa planta daninha não será exagero.
Geralmente, o capim-capeta invade uma propriedade, pela porteira, pois as sementes e o solo contaminado com as sementes são transportados nos pneus e carcaças de veículos e implementos, nos calçados e roupas das pessoas, nos pelos e fezes dos animais e na água da enxurrada.
Por esta razão, o produtor deve ficar atento para possíveis infestações nas áreas de acesso à sua propriedade e ao longo de caminhos, estradas e, principalmente, ao longo das cercas divisórias com a propriedade vizinha.
Como forma de prevenção, recomendo que seja mantida uma área de dez metros de largura, livre de capim-capeta, ao longo de estradas e caminhos na propriedade rural. Também, é importante evitar que máquinas e implementos, usados em uma área infestada pelo capim-capeta, sejam usados em áreas ainda não infestadas.
O produtor deve conscientizar funcionários e visitantes sobre a possibilidade de serem vetores da disseminação do capim-capeta, caso tenham estado em uma área invadida por esta planta.
Outra recomendação importante de prevenção diz respeito à aquisição de gado que pastejavam áreas infestadas pelo capim-capeta, ou quando não se souber a procedência desse gado. Nessa situação, o ideal é que esse gado fique por cinco a sete dias em um “pasto quarentena” e, só depois, seja transferido para pastagens ainda não infestadas, na fazenda.
A recomendação básica para dificultar o aparecimento e a proliferação do capim-capeta na sua propriedade rural é adequar o manejo do pastejo, evitando a queda de vigor da pastagem. Ou seja, o produtor deve sempre manter as pastagens vigorosas, por meio de adubações periódicas e controle do manejo do pastejo, impedindo o aparecimento de áreas de solo descoberto
Controle
O controle do capim-capeta é uma tarefa difícil e de longo prazo, sendo que o método de controle deve ser determinado pelo grau de ocorrência desse capim na pastagem.
Assim, até 10% de infestação da área da pastagem (até duas plantas por 10m2, ou seja, 2000 plantas de capim-capeta/ha) é considerado uma infestação leve. Qualquer infestação acima desse valor deve ser considerada uma infestação pesada.
Nas infestações leves, ou seja, plantas isoladas ou em pequenas reboleiras, as plantas devem ser arrancadas manualmente, ou eliminadas com aplicação dirigida de um herbicida não seletivo (catação química), como o glifosato (Figura 4).

Figura 4. Aspecto do resultado do controle de uma planta de capim-capeta, após a aplicação dirigida do glifosato. Foto: Moacyr B. Dias-Filho
É importante ressaltar que, até o momento, não há herbicidas pós-emergentes seletivos, registrados, no Brasil, para o controle do capim-capeta, em pastagens.
Uma recomendação importante para as infestações ainda leves é que, sempre que possível, as panículas devem ser cortadas, ensacadas e queimadas, em local distante da pastagem. A justificativa para esta medida é que cada semente pode gerar uma nova planta, capaz de produzir cerca de 200 mil sementes, em um único ano. Essas sementes podem ficar vários anos armazenadas no solo, prontas para germinar.
Nas infestações pesadas, quando o controle com glifosato não for mais viável, há necessidade da renovação da pastagem. Nesse caso, o maior problema é a imensa reserva de sementes que pode existir no solo (banco de sementes). Com isso, aumentam as chances de reinfestação.
O maior obstáculo para o controle químico da capim-capeta, nas infestações pesadas, é a falta de herbicidas pós-emergentes seletivos, que sejam registrados para o uso em pastagens, no controle desse capim.
Por ainda não haver alternativa, o controle químico desse capim, algumas vezes, tem sido tentado pelos produtores, de forma empírica, com herbicidas registrados para outras culturas (por exemplo, milho e cana-de-açúcar), na tentativa de se encontrar produtos e doses que controle o capim-capeta e que sejam seletivos, ou seja, que não cause danos para as gramíneas forrageiras.
Assim, algumas das alternativas que têm sido testadas pelos produtores é o uso de Atrazina + Mesotriona + óleo mineral ou espalhante adesivo. Também, tem sido testado o uso de altas doses (10 ou mais litros/ha) de Atrazina 500 + óleo mineral + redutor de pH.
Vale ressaltar que o controle químico só terá sucesso se o herbicida for aplicado nas folhas do capim-capeta e não nas panículas. Além disso, é essencial que o herbicida seja aplicado, quando o solo estiver úmido. Ou seja, quando a planta estiver crescendo ativamente, durante o período chuvoso.
É importante salientar que uso de herbicidas não registrados pode acarretar alguns problemas, como a inexistência de informação técnica do período de carência, entre a aplicação do produto e o pastejo do gado. Portanto, é urgente que herbicidas registrados para o controle do capim-capeta, em pastagens, sejam disponibilizados pela indústria, para a maior segurança e tranquilidade do produtor rural.
Controle integrado
Independentemente do método de controle empregado, o controle só terá sucesso ser for feita de maneira integrada com práticas de manejo que aumentem o vigor da pastagem. Ou seja, o fortalecimento da pastagem potencializa os métodos de controle do capim-capeta.
Assim, o controle químico deve ser integrado com medidas que incentivem o aumento do vigor da pastagem, como a adubação, o replantio das áreas que apresentam solo descoberto e o controle cuidadoso da pressão de pastejo, ou seja, não se deve exagerar na carga animal, em pastagens com histórico de invasão do capim-capeta.
O objetivo é diminuir as chances de nova infestação, pela germinação das sementes do capim-capeta que estão no solo (banco de sementes do solo).
Mensagem final
A invasão do capim-capeta é um risco muito grave para a pecuária brasileira, pois essa planta apresenta um grande potencial invasivo e o seu controle é muito difícil e demorado.
Portanto, é proibido ter este capim na sua fazenda.
Se você ainda não tem, estabeleça um programa de prevenção, se já tem, estabeleça um programa de controle.
Recomendação de leitura e vídeo
DIAS-FILHO, M. B. Degradação de pastagens: função das plantas daninhas. Belém, PA: Embrapa Amazônia Oriental, 2024. 16 p. (Embrapa Amazônia Oriental. Documento, 492). Disponível em: https://bit.ly/4cytgGF.
DIAS-FILHO, M. B. Degradação de pastagens [livro eletrônico]: conceitos, processos e estratégias de recuperação e de prevenção. Belém, PA: Ed. do Autor, 2023. 59 p. Disponível em: https://diasfilho.com.br/degradacaodepastagens/.
DIAS-FILHO, M. B. Controle de capim-capeta [Sporobolus indicus (L.) R. Br.] em pastagens no estado do Pará. Belém, PA: Embrapa Amazônia Oriental, 2015. 7 p. (Embrapa Amazônia Oriental. Comunicado técnico, 268). Disponível em: http://bit.ly/2iRQvR6.
Vídeo: A ameaça do avanço do Sporobolus nas pastagens brasileiras (https://bit.ly/3AZWJwd)
Dados do autor:
Moacyr Bernardino Dias-Filho
Eng. Agrônomo, Mestre em Pastagens, Ph.D. em Ecofisiologia vegetal.
Atividade e local onde a exerce: Pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, Belém, PA
Contato: moacyr.dias-filho@embrapa.br
https://www.instagram.com/moacyrbdiasfilho